Um poeta sensual, ousado, fascinante!

Das muitas faces de Drummond, deixo hoje aqui uma que talvez poucos conheçam. 

Publicado após sua morte, o livro O amor natural é uma coletânea de seus poemas eróticos

O fato de O amor natural não ter sido publicado em vida por Drummond demonstra um anseio diante de seu tempo. O poeta tinha plena consciência dos limites entre o erotismo e a pornografia. Optou, portanto, por uma não confusão entre um e outro em seus poemas. Possivelmente por considerar um tanto vulgar o tratamento do sexo como pornografia. É evidente, inclusive, que o amor e a sexualidade são, para ele, como algo único, que não estão desassociados.
Desde o título, a obra joga com o conceito de natureza no que diz respeito ao amor. O poeta trata o sexo enquanto manifestação do amor, o sexo como algo natural do ser humano. Os poemas que constituem O amor natural apresentam o sexo como forma de atingir a plenitude da existência pela busca do prazer.  A linguagem drummondiana poetiza o ato sexual, mas ao utilizar termos como “vagina”, “pênis” e “bunda”, não o camufla.
O amor natural tem quarenta poemas que representam o prazer sexual relacionado ao sentimento amoroso.
Fonte: http://homoliteratus.com



Amor - Pois que é Palavra Essencial


Amor — pois que é palavra essencial
comece esta canção e toda a envolva.
Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,
reúna alma e desejo, membro de vulva.

Quem ousará dizer que ele é só alma?
Quem não sente no corpo a alma expandir-se
até desabrochar em puro grito
de orgasmo, num instante de infinito?

O corpo noutro corpo entrelaçado,
fundido, dissolvido, volta à origem
dos seres, que Platão viu completados:
é um, perfeito em dois; são dois em um.

Integração
na cama ou já no cosmo?
Onde termina o quarto e chega aos astros?
Que força em nossos flancos nos transporta
a essa extrema região, etérea, eterna?

Ao delicioso toque do clitóris,
já tudo se transforma, num relâmpago.
Em pequenino ponto desse corpo,
a fonte, o fogo, o mel se concentraram.

Vai a penetração rompendo nuvens
e devassando sóis tão fulgurantes
que nunca a vista humana os suportara,
mas, varado de luz, o coito segue.

E prossegue e se espraia de tal sorte
que, além de nós, além da própria vida,
como activa abstracção que se faz carne,
a ideia de gozar está gozando.

E num sofrer de gozo entre palavras,
menos que isto, sons, arquejos, ais,
um só espasmo em nós atinge o clímax:
é quando o amor morre de amor, divino.

Quantas vezes morremos um no outro,
no úmido subterrâneo da vagina,
nessa morte mais suave do que o sono:
a pausa dos sentidos, satisfeita.

Então a paz se instaura. A paz dos deuses,
estendidos na cama, quais estátuas
vestidas de suor, agradecendo
o que a um deus acrescenta o amor terrestre. 



Sob o Chuveiro Amar

Sob o chuveiro amar, sabão e beijos,
ou na banheira amar, de água vestidos,
amor escorregante, foge, prende-se,
torna a fugir, água nos olhos, bocas,
dança, navegação, mergulho, chuva,
essa espuma nos ventres, a brancura
triangular do sexo — é água, esperma,
é amor se esvaindo, ou nos tornamos fonte?





A LÍNGUA LAMBE

A língua lambe as pétalas vermelhas

da rosa pluriaberta; a língua lavra


certo oculto botão, e vai tecendo


lépidas variações de leves ritmos.



E lambe, lambilonga, lambilenta,

a licorina gruta cabeluda,


e, quanto mais lambente, mais ativa,


atinge o céu do céu, entre gemidos,


entre gritos, balidos e rugidos


de leões na floresta, enfurecidos.








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